terça-feira, 17 de fevereiro de 2009

CONTO - A BONECA (Amor de Mãe parte VII)


( este texto, copiei da Comunidade OS DOIS LADOS DA MOEDA, no Orkut, escrito por Lavínia...


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Carminha não cabia em si de felicidade com a sua bonequinha. Como menina negra e pobre do morro ela nunca tivera um brinquedo tão lindo. Naqueles quatro dias ela só brincou de mamãe, trocou a roupinha, deu banho na boneca, fez papinha de barro com pedacinhos de casca de manga e cantou canções de ninar para a boneca. Ela não se cansava de admirar a face tranquila do seu lindo brinquedo.

- Filha, tá na hora da gente ir pra festa...

- Posso levar a boneca, papai?

A dor nos olhos do homem era comovente, mas ele sabia que tinha que ser firme:

- Não, amorzinho! Melhor não! Imagina se outra menina fica com inveja e rouba a sua bonequinha? Tem quatro dias que você não faz outra coisa além de ficar abraçada com ela, já imaginou se ela quebra ou se te roubam na festa?

O olhar de medo de Carminha mostrou que ela havia entendido a preocupação do pai. Ela foi correndo colocar o brinquedo na caixinha branca, alisou o vestidinho florido e saiu toda feliz para a festinha.

O marido de Carmem pegou pela mão da esposa com o carinho devido a filha tardia que o destino lhe dera, e com uma lágrima solitária descendo pela face ele olhou pela última vez para o pequeno corpo de oito meses, trespassado por uma bala perdida e já roxo e putrefato. Sua filha de verdade se fora, restando apenas uma mãe mortalmente ferida, que voltara aos cinco anos de idade e que ele teria que cuidar pra sempre.

O presidente da associação de moradores da favela fechou finalmente o pequeno caixão branco e retirou o corpo do barraco, com a proteção dos policiais do BOPE.

Carminha não viu nada disso! Estava descendo o morro toda feliz, pulando e saltitando na alegria dos cinco anos de idade que viveria dali pra frente. Seu sorriso era contagiante e ela só conseguia pensar nos doces que comeria na "festa" e no prazer de voltar pra casa para brincar novamente com a sua linda "boneca".

Mas alegria de pobre dura pouco. Depois da consulta com a psicóloga do SUS, Carminha nunca mais sorriu na vida...



Lavinia.

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